Palavras soltas que se encontram e tomam formas que por vezes não queremos ver.
Formas que sentimos bem perto... que perdemos... que não vivemos.
Utopias. Imaginários reais em que um dia acreditamos.
País que se esconde no espelho e onde queremos viver... afinal, é só nosso.
Reflexos de uma vida, afinal, assim tão simples... cada dia acordar só para de novo te olhar...
"Tenho em mim todos os sonhos do mundo", Fernando Pessoa
sábado, 30 de agosto de 2008
sexta-feira, 25 de abril de 2008
A Insustentável Leveza do Ser
Há livros que nos tocam profundamente e este é sem dúvida alguma, um deles. Talvez um dos melhores livros que li até hoje. É impossível descrever aquilo que é a reflexão filosófica da vida, escrita da forma mais descomplicada, através da teia de relações humanas e das contradições que existem em cada um de nós.
O essencial da vida, do amor e do Homem na “Insustentável Leveza do ser”.
Apenas dois excertos que considero fantásticos (Vale a pena ler até ao fim):
"Não há forma nenhuma de se verificar qual das decisões é melhor porque não há comparação possível. Tudo se vive imediatamente pela primeira vez, sem preparação como se um actor entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que vale a vida se o primeiro ensaio da vida é já a própria vida?"
“(...)Mas, desde que vivia com Tereza, a sua actividade erótica esbarrava com várias dificuldades de organização; não lhe podia reservar senão uma estreita faixa de tempo (entre a sala de operações e a chegada a casa) que, embora explorada intensivamente (como o montanhês faz com a sua estreita parcela), estava longe de poder comparar‑se com o espaço de dezasseis horas com que subitamente se via presenteado. (E digo dezasseis porque mesmo as oito horas que passava a lavar vidros lhe ofereciam mil e uma oportunidades de fazer novos conhecimentos com empregadas de balcão, caixeiras ou donas de casa e de marcar encontros com elas.)
O que procurava em todas essas mulheres? O que é que o atraía? O amor físico não é sempre a eterna repetição do mesmo?
De forma nenhuma. Há sempre uma pequena percentagem de inimaginável. Quando via uma mulher vestida, embora, evidentemente, pudesse fazer mais ou menos uma ideia de como seria depois de despida (aqui a sua experiência de médico completava a do amante), restava sempre um pequeno intervalo de inimaginável entre a inexactidão da ideia e a precisão da realidade, e era precisamente essa lacuna que lhe tirava o sossego. E, depois, a busca do inimaginável não termina com a descoberta da nudez; vai para além dela: que caras fará enquanto se despe? o que dirá enquanto faz amor? em que tom suspirará? que ritmo se imprimirá no seu rosto no momento da volúpia?
O que o eu tem de único encontra‑se precisamente naquilo que o ser humano tem de inimaginável. Só consegue imaginar‑se o que é idêntico em todos, o que é comum a todos. O eu individual é aquilo que se distingue do geral, e é, portanto, aquilo que não pode ser adivinhado nem calculado antecipadamente, aquilo que primeiro é preciso desvendar, descobrir, conquistar no outro.
Tomás, que nos últimos dez anos da sua actividade profissional se ocupara exclusivamente do cérebro, sabia que nada é mais difícil de distinguir do que o eu. Entre Hitler e Einstein ou entre Brejnev e Soljenitsyne há muito mais semelhanças do que diferenças. Dizendo‑o por números, entre eles há um milionésimo de diferente e novecentos e noventa e nove mil novecentos e noventa e nove milionésimos de semelhante.
Tomás vivia obcecado pelo desejo de descobrir esse milionésimo e de apoderar‑se dele, e esse era o sentido que dava à sua obsessão por mulheres. Não vivia obcecado pelas mulheres, vivia era obcecado pelo que cada uma delas tem de inimaginável ou, por outras palavras, vivia obcecado por esse milionésimo de diferente que faz com que uma mulher se distinga das outras. (Talvez fosse aí que a sua paixão de cirurgião se encontrava com a sua paixão de sedutor. Nunca largava o seu bisturi imaginário, mesmo quando estava com as amantes. Desejava apoderar‑se de qualquer coisa que estava profundamente enterrado nelas e por causa da qual tinha de rasgar os seus invólucros superficiais.)
Claro que temos o direito de perguntar por que é que era na sexualidade que ia procurar esse milionésimo de diferente. Não poderia antes encontrá‑lo, por exemplo, na maneira de andar, nos gostos culinários ou nas preferências estéticas de cada uma?
O milionésimo de diferente está presente em todos os aspectos da vida humana, mas é publicamente desvendado em todo o lado, não precisa de ser descoberto, não é preciso nenhum bisturi para chegar a ele. O facto de uma mulher gostar mais de queijo do que de doces e de outra detestar couve‑flor é com certeza um sintoma de originalidade, mas também se torna imediatamente evidente que essa originalidade é insignificante e vã e que não seria senão uma perda de tempo alguém interessar‑se por ela e conferir‑lhe algum valor.
Só na sexualidade é que o milionésimo de diferente aparece como uma coisa preciosa, porque não é publicamente acessível e tem de ser conquistado. Ainda há meio século, este tipo de conquista exigia que se lhe dedicasse muito tempo (várias semanas e, às vezes, alguns meses) e o valor do objecto conquistado era proporcional ao tempo consagrado à sua conquista. Mesmo nos dias que correm, embora o tempo da conquista tenha diminuído consideravelmente, a sexualidade é para nós como que o cofrezinho das jóias onde se encontra guardado o mistério do eu feminino.
Não era, portanto, de forma nenhuma, o desejo da volúpia (a volúpia aparecia por assim dizer como brinde), mas o desejo de apoderar‑se do mundo (de abrir com o bisturi o corpo jazente do mundo) que o fazia andar atrás das mulheres. "
O essencial da vida, do amor e do Homem na “Insustentável Leveza do ser”.
Apenas dois excertos que considero fantásticos (Vale a pena ler até ao fim):
"Não há forma nenhuma de se verificar qual das decisões é melhor porque não há comparação possível. Tudo se vive imediatamente pela primeira vez, sem preparação como se um actor entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que vale a vida se o primeiro ensaio da vida é já a própria vida?"
“(...)Mas, desde que vivia com Tereza, a sua actividade erótica esbarrava com várias dificuldades de organização; não lhe podia reservar senão uma estreita faixa de tempo (entre a sala de operações e a chegada a casa) que, embora explorada intensivamente (como o montanhês faz com a sua estreita parcela), estava longe de poder comparar‑se com o espaço de dezasseis horas com que subitamente se via presenteado. (E digo dezasseis porque mesmo as oito horas que passava a lavar vidros lhe ofereciam mil e uma oportunidades de fazer novos conhecimentos com empregadas de balcão, caixeiras ou donas de casa e de marcar encontros com elas.)
O que procurava em todas essas mulheres? O que é que o atraía? O amor físico não é sempre a eterna repetição do mesmo?
De forma nenhuma. Há sempre uma pequena percentagem de inimaginável. Quando via uma mulher vestida, embora, evidentemente, pudesse fazer mais ou menos uma ideia de como seria depois de despida (aqui a sua experiência de médico completava a do amante), restava sempre um pequeno intervalo de inimaginável entre a inexactidão da ideia e a precisão da realidade, e era precisamente essa lacuna que lhe tirava o sossego. E, depois, a busca do inimaginável não termina com a descoberta da nudez; vai para além dela: que caras fará enquanto se despe? o que dirá enquanto faz amor? em que tom suspirará? que ritmo se imprimirá no seu rosto no momento da volúpia?
O que o eu tem de único encontra‑se precisamente naquilo que o ser humano tem de inimaginável. Só consegue imaginar‑se o que é idêntico em todos, o que é comum a todos. O eu individual é aquilo que se distingue do geral, e é, portanto, aquilo que não pode ser adivinhado nem calculado antecipadamente, aquilo que primeiro é preciso desvendar, descobrir, conquistar no outro.
Tomás, que nos últimos dez anos da sua actividade profissional se ocupara exclusivamente do cérebro, sabia que nada é mais difícil de distinguir do que o eu. Entre Hitler e Einstein ou entre Brejnev e Soljenitsyne há muito mais semelhanças do que diferenças. Dizendo‑o por números, entre eles há um milionésimo de diferente e novecentos e noventa e nove mil novecentos e noventa e nove milionésimos de semelhante.
Tomás vivia obcecado pelo desejo de descobrir esse milionésimo e de apoderar‑se dele, e esse era o sentido que dava à sua obsessão por mulheres. Não vivia obcecado pelas mulheres, vivia era obcecado pelo que cada uma delas tem de inimaginável ou, por outras palavras, vivia obcecado por esse milionésimo de diferente que faz com que uma mulher se distinga das outras. (Talvez fosse aí que a sua paixão de cirurgião se encontrava com a sua paixão de sedutor. Nunca largava o seu bisturi imaginário, mesmo quando estava com as amantes. Desejava apoderar‑se de qualquer coisa que estava profundamente enterrado nelas e por causa da qual tinha de rasgar os seus invólucros superficiais.)
Claro que temos o direito de perguntar por que é que era na sexualidade que ia procurar esse milionésimo de diferente. Não poderia antes encontrá‑lo, por exemplo, na maneira de andar, nos gostos culinários ou nas preferências estéticas de cada uma?
O milionésimo de diferente está presente em todos os aspectos da vida humana, mas é publicamente desvendado em todo o lado, não precisa de ser descoberto, não é preciso nenhum bisturi para chegar a ele. O facto de uma mulher gostar mais de queijo do que de doces e de outra detestar couve‑flor é com certeza um sintoma de originalidade, mas também se torna imediatamente evidente que essa originalidade é insignificante e vã e que não seria senão uma perda de tempo alguém interessar‑se por ela e conferir‑lhe algum valor.
Só na sexualidade é que o milionésimo de diferente aparece como uma coisa preciosa, porque não é publicamente acessível e tem de ser conquistado. Ainda há meio século, este tipo de conquista exigia que se lhe dedicasse muito tempo (várias semanas e, às vezes, alguns meses) e o valor do objecto conquistado era proporcional ao tempo consagrado à sua conquista. Mesmo nos dias que correm, embora o tempo da conquista tenha diminuído consideravelmente, a sexualidade é para nós como que o cofrezinho das jóias onde se encontra guardado o mistério do eu feminino.
Não era, portanto, de forma nenhuma, o desejo da volúpia (a volúpia aparecia por assim dizer como brinde), mas o desejo de apoderar‑se do mundo (de abrir com o bisturi o corpo jazente do mundo) que o fazia andar atrás das mulheres. "
sábado, 5 de abril de 2008
Bloguemania
Pois é…ainda que involuntariamente acabei por aderir a esta teia pegajosa de post’s e comentários que parece fazer delirar a comunidade “carneirista”, tão comum, deste País. Apesar de até achar algo interessante este novo conceito de liberdade de expressão, parece-me a mim que é necessário ter alguma disponibilidade para o fazer. Disponibilidade de tempo, dos meios necessários, mental e emocional. Visto isto, esta minha tentativa de manter um blogue activo é uma batalha praticamente perdida logo à partida. Quem me conhece (ou melhor quem ainda se lembra de mim) sabe que a minha disponibilidade de tempo para estas pequenas coisas da vida é praticamente nula assim como a disponibilidade dos meios, uma vez que pertenço a uma espécie cada vez mais rara de seres humanos que não têm Internet (nem tv cabo…nem sofá), como também não moro perto da Liliana…a coisa complica-se no que toca às actualizações deste projecto de blogue.
Por outro lado, a minha motivação para escrever seja o que for ficou destruída no momento em que me abriram os olhos e me fizeram descobrir que nem todas as cabeças levam chapéus…assim vou deixar de inventar o que escrever e passar a transcrever o que outros já inventaram, que é como quem diz... Dizer, Porquê? e Para quê?
”Dizer porquê e para quê do que descubro
que a vida ensina ou julgo que ela ensina?
Se o só descubro quando passou tempo,
e a gente já passou como eu também?
Se quem me leia não me entenderá?-
ou são mais velhos e já sabem,
ou mais antigos e têm outra língua
ou são mais jovens crendo que o saber
é a sua descoberta em que de passo em passo
descobrirão que a vida não ensina
senão o que mais tarde em nós descobriremos
de quanto nunca foi ou não escolhemos.
Di-lo-ei por mim e para mim? Porquê
Aos outros? Que comum tenho com eles
além de lhes dizer que não importa
dizer o que não dizem? se não há
maneira alguma de viver de novo
o que quiséramos que a vida fora?
E se outros não de nós mas de si mesmos
já descobriram de outro modo a mesma coisa,
ou hão-de descobri-la? De experiência
Falamos e falemos. E nenhuma
serve a ninguém. Que tê-la não atendo
Ou que não tê-la tendo-a é o que se diz dizendo.”
Jorge de Sena
Por outro lado, a minha motivação para escrever seja o que for ficou destruída no momento em que me abriram os olhos e me fizeram descobrir que nem todas as cabeças levam chapéus…assim vou deixar de inventar o que escrever e passar a transcrever o que outros já inventaram, que é como quem diz... Dizer, Porquê? e Para quê?
”Dizer porquê e para quê do que descubro
que a vida ensina ou julgo que ela ensina?
Se o só descubro quando passou tempo,
e a gente já passou como eu também?
Se quem me leia não me entenderá?-
ou são mais velhos e já sabem,
ou mais antigos e têm outra língua
ou são mais jovens crendo que o saber
é a sua descoberta em que de passo em passo
descobrirão que a vida não ensina
senão o que mais tarde em nós descobriremos
de quanto nunca foi ou não escolhemos.
Di-lo-ei por mim e para mim? Porquê
Aos outros? Que comum tenho com eles
além de lhes dizer que não importa
dizer o que não dizem? se não há
maneira alguma de viver de novo
o que quiséramos que a vida fora?
E se outros não de nós mas de si mesmos
já descobriram de outro modo a mesma coisa,
ou hão-de descobri-la? De experiência
Falamos e falemos. E nenhuma
serve a ninguém. Que tê-la não atendo
Ou que não tê-la tendo-a é o que se diz dizendo.”
Jorge de Sena
sábado, 29 de março de 2008
Há palavras que nos beijam...
A palavra...a escrita...a palavra que é escrita, mais do que a que é dita, é a forma mais pura de expressão. A arte de escrever, mais do que qualquer outra, permite ouvir um simples respirar, sentir o perfume mais ténue de uma flôr, vêr...o que se quiser mostrar...despertar em nós todos os sentidos, emoções e expectativas numa só...palavra que nos beija...
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Alexandre O´neil
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.
Alexandre O´neil
domingo, 2 de março de 2008
Mosca morta
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